St. Justin Martyr

O passado – atrás de nós no tempo, em volta de nós no espaço

Em um mundo que glorifica o futuro, que valoriza o progresso e que tem a tendência de desprezar o que veio antes, existe um paradoxo literalmente astronômico. Desde as viagens de descoberta a partir do século XV, e as revelações da arqueologia e paleontologia dos últimos dois séculos, o conhecimento do nosso passado cronológico tem crescido exponencialmente. Sabemos agora que carregamos – tanto geologicamente em nossa Terra quanto geneticamente em nossos corpos – milhões de anos de desenvolvimento que impactam poderosamente nossas vidas e nossa visão do mundo. O badalado ‘futuro’ ocupa apenas um grão de areia em comparação.

Porém, a preeminência do passado tem se afirmado com ainda mais soberania graças às últimas descobertas científicas da astronomia. Desde a descoberta, há cem anos, da multiplicidade das galáxias do nosso universo – até à década de 1920 identificamos nossa Via Láctea com a totalidade do cosmos mesmo – o tamanho espacial da realidade expandiu além de cada horizonte, e o número de corpos celestes e galáxias chegaram a trilhões e quadrilhões. Mas enquanto ficamos boquiabertos sobre essas quantidades, uma simples verdade sobre os novos dados é apenas sussurrada, em vez de ser gritada – como merece – aos quatro ventos.

Quando olhamos para a abóbada celeste – se de olho nu, por telescópicos tradicionais, ou pela penetração infravermelha do novo James Webb Telescope – estamos vendo apenas história, apenas o passado. Não vemos o universo como foi ‘uma vez’ ou como é ‘agora’ – nem podemos. Vemos o nosso universo, e é o único universo que é real para a vida humana. E para adicionar insulto à injúria às nossas ambições científicas, nem vemos ‘o passado’, e sim ‘os passados’, ou seja, milhares e milhões e bilhões de passados desligados cronologicamente. A luz de cada astro e cada galáxia chega aqui segundo seu próprio calendário cósmico, sem sincronização com todos os outros.

Mas, para o astrônomo, esses pontos de luz nem têm uma história para contar – apenas quantidades a serem medidas, distâncias e forças a serem calculadas. ‘Sentido’ não têm, só medições. Porém, não obstante essa visão obsecada com quantidades, os fenômenos comunicam algo meio inesperado pelos cientistas: eles nos lembram que nossa antiga perspectiva terrestre – como vemos a abóbada celeste cada noite – ganhou assim uma nova confirmação da sua importância e centralidade. Reconquistou o sentido que de fato sempre tinha. O mistério do universo – o atributo mais manifesto de todos – continua ostentando suas glórias cada noite. Caeli enarrant gloriam Dei. (Ps. 18)

As consequências filosóficas e teológicas de tudo isso são formidáveis. Mas entrementes, deveríamos nos assentar, gratamente, dentro desta matriz tanto cronológica quanto cósmica. É, no final das contas, nosso lar.

 

Leia também: “What We Cannot Learn from the James Webb Telescope”.

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