St. Justin Martyr

As três pernas de um tamborete

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Nossas vidas sensoriais e emocionais radicam em nossos corpos; nosso pensamento e vontade em nossas mentes; nossas aspirações mais profundas e nosso caráter crescente, em nossos corações. O humano se atrofia, a menos que os três – corpo, mente e coração – se desenvolvam e interajam. Em primeiro lugar, é fácil perceber e sentir espontaneamente, como fazem os animais; mas nós, seres humanos, somos chamados a formar e disciplinar nossas vidas sensoriais e emocionais por meio daquilo que chamamos das belas artes, mesmo em forma bem amadora. As artes falam também à mente e ao coração, mas seu vocabulário está nos sentidos (por exemplo, a pintura está para o olho, assim como a música para os ouvidos, a literatura para a imaginação, etc.). Uma experiência rica e ordenada nas artes e nos estudos humanísticos enche nossas memórias de canções, estórias, visões e arquétipos – experiência sobre a qual a mente mais tarde pensará, a vontade fará suas escolhas, e à qual o coração, finalmente, responderá.

Em segundo lugar, cada um de nós pensa e, ainda que de modo rudimentar, filosofa (Por que isto? Qual o sentido daquilo? De onde veio A?  Para onde vai B?). Porém, ao menos algumas pessoas têm de fazer essas coisas de forma disciplinada e com método, a fim de ajudar os outros a pensar tão clara e realisticamente quanto possível. A liberdade de nossas vontades prospera apenas quando o pensamento é reto.

Por fim, quando tudo foi dito e feito (ou melhor talvez: sentido e pensado), há uma terceira dimensão, mais profunda e ‘aquém’ de toda a sensação, emoção, pensamento e escolha. As tradições mundiais frequentemente referem-se a esse algo como o ‘coração’, significando o ponto de convergência de todas as faculdades supramencionadas – ou seja, aquele centro fugidio, mas intensa e densamente real de nosso ser. Nossos atos sensoriais e mentais parecem pairar sobre a superfície desse centro ou orbitar ansiosamente em torno dele. Mas, este mesmo centro leva-nos – seja de modo religioso ou ‘religiosamente secular’ – a uma atitude de absolutização, quer queiramos ou não.

Somos compelidos por nossos corações a adorar algo, o que quer que seja, e a absolutizá-lo, e se não for Deus o objeto dessa adoração, será algo diferente (nós próprios, dinheiro, poder, prazer – complete a lista você mesmo). G.K. Chesterton observou que quando pessoas param de acreditar em Deus, não é que eles acreditam em nada, mas que acreditam em qualquer coisa. Essas coisas já se confundem um bocado quando a arte tenta ser filosofia, ou a filosofia arte, mas nenhuma confusão é tão comum hoje, ou tão perigosa, como quando filosofia ou arte finge ser religião. Tão-somente quando a arte, a filosofia e a religião permanecem distintas, mas inseparáveis – como as três pernas de um tamborete –, é que a vida pode encontrar o apoio de que precisa. Depois, podemos nos alçar e trilhar o nosso caminho irregular com um equilíbrio precário, mas mesmo assim gostoso.

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